Incêndios e Mudança Climática (por Jorge Leandro Rosa)

Sobre os incêndios florestais em Portugal em 2017, os factos e os dados são desoladores! Muitos fatores contribuem para este estado apocalíptico, e é urgente enfrentar o problema com seriedade.

O quadro do ICNF mostra que a ardida até julho foi quase 6 vezes superior à média dos 10 anos anteriores, e de acordo com dados mais recentes, em 22/8 a área ardida em 2017 foi de 166 mil hectares!
Dados do ICNF  obtidos no relatório aqui
O interessante texto que se segue, de Jorge Leandro Rosa, alerta para um dos fatores que não pode deixar de ser equacionado: as alterações climáticas.

«INCÊNDIOS E MUDANÇA CLIMÁTICA: O TÍTULO DE PRIMEIRA PÁGINA QUE NUNCA LERÃO NA IMPRENSA PORTUGUESA

Esta notícia do DN - Incêndios voltam a bater recorde e Portugal pede ajuda à Europa) - é apenas um exemplo do inútil e enganador retrato que a imprensa portuguesa tem vindo a dar dos incêndios «recordistas» em Portugal.  Estamos a bater recordes a cada nova vaga de incêndios. Ou é o incêndio com mais mortos, ou o dia com mais incêndios. 

Este sensacionalismo estéril tem o seu eco institucional no «pro-activismo» do governo e das outras forças políticas, ou mesmo na falta de perspectiva da maior parte dos especialistas chamados a opinar. 

Todos os sectores de opinião, incluindo muitos ambientalistas, e sectores da sociedade têm graves responsabilidades nesta obtusa e muitas vezes voluntária negação do aspecto mais sério da crise dos incêndios. Tudo isto seria apenas mais um exemplo do provincianismo local se não fosse a trágica ilustração da incompreensão nacional do que significa para nós a mudança climática em curso.

A mudança climática provocada pela sociedade industrial é o processo mais destrutivo em que a humanidade está ou esteve envolvida. E isto pela simples razão de que o clima (que parece a alguns, em Portugal, uma simples palavra de boletim meteorológico) DETERMINA TUDO. Sendo um processo dinâmico e complexo, ela afecta tudo e todos, mas não da mesma maneira nem à mesma velocidade. 

Portugal está num dos pontos mais sensíveis do planeta: a península ibérica está exposta a processos de desertificação que, muito provavelmente, a tornarão parcialmente inabitável em pouco tempo. As mudanças decisivas nos ciclos das estações estão a alterar o habitat de muitas espécies e, sobretudo, estão a comprometer os recursos aquíferos e a possibilidade de aqui continuar as práticas agrícolas iniciadas no Neolítico. Ou seja, a mudança climática comprometerá, muito rapidamente, a sustentação da vida humana nestes territórios.
Imagem obtida em Fogos.pt (22-8-2017, 23:56)

A sociedade portuguesa entrou numa fase grotesca da sua auto-representação. Embriagada por vagas promessas de relançamento económico, entretemo-nos a discutir de um modo tecnocrático o combate aos incêndios, como se bastasse uma maior eficácia dos dispositivos para resolver aquilo que é, obviamente, um problema global.

O debate sobre o eucalipto tem razão de ser: que sentido faz admitir uma tal espécie num território tão ameaçado e fragilizado? Mas deixa de fazer sentido quando ignora o quadro dinâmico da mudança climática. 

Em geral, estes debates ignoram a complexidade da mudança climática, as novas dimensões da nossa situação, que fazem com que já não hajam catástrofes APENAS naturais ou APENAS humanas. 

O exemplo patético é o debate sobre as falhas do SIRESP e do seu sistema de comunicação de incêndios. Esse debate é um sobrevivente de uma das mitologias pós-modernas, aquela que hipertrofiava o poder da informação para resolver sistemicamente os problemas. 

Ao mesmo tempo, a sociedade portuguesa é uma das sociedades mais motorizadas a nível global: o automóvel privado carbónico é o pequeno deus egoísta que domina as nossas ruas e estradas. E os media, todo e qualquer espaço mediático, estão cheios de anúncios publicitários a automóveis cada vez maiores, cada vez mais apetecíveis, cada vez mais absurdos. 

A passividade dos cidadãos perante esta invasão ideológica do ecocídio motorizado é o melhor retrato do estado da sociedade portuguesa. Os incêndios serão cada vez mais e mais furiosos. E com eles virá o incêndio social e político do Estado português

Jorge Leandro Rosa, 13/8/2017 ( Fonte: tópico "O estado do Espaço Público diante da mudança climática" do grupo Futuro Terra ou aqui)

Comentários

  1. Uma sensata abordagem ao estado da nossa nação. Precisamos de acção de todos e cada um de nós.

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  2. Boas!

    Se há coisa que SEMPRE existe no Planeta... é algo a arder!

    Mas, ainda que aceitemos de barato que a PRINCIPAL causa do que ocorreu este ano em Portróical foram as "Alterações Climáticas"... Então resta-nos apenas e só preparar para os próximos fogos! Isto se considerarmos igualmente que a CAUSA PRINCIPAL das "Alterações Climáticas" é a actividade do degenerado animal humano!

    voza0db

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